Medo? Eu?
OS BRINQUINHOS DE
MARIA
Maria
era muito querida por sua mãe. Ainda bebê, recebeu dela lindos brinquinhos de
ouro. “São para Maria saber como é amada
e especial”, disse a sua mãe quando colocou os brinquinhos na menina. Mas a
vida tem tanta coisa triste que a gente não espera... No aniversário de sete
anos, a mãe de Maria morreu. A menina,
que gostava muito de seus brinquinhos de ouro, ficou ainda mais cuidadosa com
eles.
Aconteceu
que, em num verão, Maria foi se banhar no rio, contrariando as instruções de
seu pai. Com medo de perder os brinquinhos, tirou o par e escondeu na fresta de
uma pedra perto de um arbusto. Enquanto se banhava distraída, Maria nem
percebeu a presença de um homem grande e maltrapilho que a observava.
Assim
que saiu do rio, o homem capturou Maria e colocou-a num saco grande e sujo onde
guardava tudo o que lhe pertencia. Pegou também os brincos da menina.
Desesperada, Maria pensava nos brinquinhos e em voltar para casa, cantava
baixinho de medo e pavor da escuridão dentro do saco.
“Meus brinquinhos de ouro que eu na
fonte deixei... Ô esquindim dan, ô esquindim dandan...”.
Assim
foi por toda a noite. A menina não se lembravade ter passado tristeza maior
desde a morte da mãe. Fechava os olhos dentro do saco e cantava sem parar: “Meus brinquinhos de ouro que eu na fonte
deixei... Ô esquindim dan, ô esquindim dandan...”.
O
homem estava faminto, e ao ouvir Maria a noite inteirinha teve uma ideia. Foi
até uma casa, tocou a campainha e, assim que chegou a dona da casa, o homem
disse: “Minha senhora, quero comida.
Arroz, feijão e farofa, suco de limão e goiabada. Pago a bondade com mágica e
encantamento. Sou dono de um saco maravilhoso que, com minha ordem cantarola
com voz doce de menina”. A dona da casa se espantou. Como era curiosa,
pediu demonstração. O homem então esbravejou furioso como um cão.
“Cantarola, saco de esmola. Canta
alto e molengola, canta fino e canta doce, como um som de um sino. Que se em
silêncio você ficar, vai ver a cobra fumar, vai ver o caldo entornar.”
Dentro
do saco a menina tremia tanto que sua voz mal saía. Cantou e chorou. Nunca se
ouviu música tão triste. Mas a vida tem surpresa boa, que se chama destino, não
sei por que ninguém entende nem espera. A dona de casa era vizinha da menina e
de seu pai e tinha acompanhado o desespero do sumiço, madrugada todinha de
procura e rezaria.
Ao
ouvir a menina cantar, a vizinha, que de curiosidade desenvolveu esperteza,
disse que estava encantada, que além do almoço ofereceria um café fresquinho.
Chamou o moço para entrar, mas pediu para o saco ficar lá fora, que tinha medo
desses encantamentos dentro de sua casa. Chorou, fez todo tipo de exagero!
Faminto,
o moço aceitou. Amarrou o saco com nó de marinheiro e entrou na casa. A dona da
casa deixou o homem almoçando na cozinha, deu a volta ao redor da casa e
libertou a menina. No lugar dela colocou uma família inteira de ratos que
capturara na noite anterior. Depois do almoço, cafezinho tragado numa golada, o
homem queria mais. A dona da casa também. Pediu a ele que fizesse nova cantoria
no saco.
A
dona da casa se espantou. Como era
curiosa, pediu demonstração. O homem então esbravejou furioso como um cão.
“Cantarola,
saco de esmola. Canta alto e molengola, canta fino e canta doce, como um som de
um sino. Que se em silêncio você ficar, vai ver a cobra fumar, vai ver o caldo
entornar.”
Nada.
O homem repetiu o brado e nadinha. Silêncio. O homem se enfureceu! Pegou um
pedaço de pau e bateu no saco. Só se ouvia o grunhido fino da rataiada.
A
dona de casa riu uma risada estrondosa e, percebendo que tinha sido enganado, o
homem deu no pé!
Maria
abraçou a vizinha com força. E voltou para casa de banho tomado, brinquinhos de
ouro nas orelhas e o coração alegre, cantarolando leve de alívio e saudades.
Seu pai a recebeu com lágrimas de alegria. Quanto ao homem, nunca mais souberam
dele. E dizem por aí que o pai de Maria se casou de novo. É que da esperteza da
moça, nasceu um amor.
(copiado
das fichas do kit do projeto “Bu! Histórias de Medo e Coragem” – 2013)
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